segunda-feira, 30 de março de 2009

Um outro Brasil é possível?


Dois fatos que aconteceram nesta semana deixaram-me mais reflexivo. Sei que ultimamente a maiêutica socrática, enquanto arte do diálogo e do debate, não anda em moda. Mas não me preocupo com os modismos, tão peculiares nestes tempos chamados de pós-modernos, mas que ainda fabrica a toque de caixa milhões de flagelados e de miseráveis não só no Brasil, mas pelo mundo todo.

O ano de 2005 está sendo um período de descobertas. Para uns, a descoberta de que a utopia está se distanciando da esperança. Para outros, a descoberta de que ainda é possível construir um Brasil melhor, de fato, um Brasil para Todos conforme aparece nos slogans de propaganda do Governo Federal. Aliás, Governo este que está perdendo a credibilidade devido à crise instalada no Palácio e em todo o âmbito da política nacional. Aqui desponta minha primeira maiêutica costurada dialeticamente pela práxis.

O atual Governo, eleito em 2002, como sinônimo de mudança, vem perdendo espaço para seus próprios erros e equívocos. Já dizia alguém no passado, talvez um agricultor com sua sabedoria popular: Errar é humano, mas persistir no erro é burrice. Quantas e quantas vezes no interior de Goiás e mesmo em São Paulo, na grande cidade, ouvi pessoas sem saberes científicos, mas providos de uma sabedoria popular imensa, afirmarem esta frase. Aliás, qual de nós, em nossas famílias, não teve uma educação informal baseada nesta singela frase de cunho pedagógico? Mas o erro apontado pela frase, não se refere somente ao indivíduo, mas também as instituições e estruturas humanas como a Igreja, os movimentos sociais, os partidos políticos e o próprio Estado.

Sabemos que desde a Campanha Eleitoral que deu a vitória ao nosso irmão Lula, o PT já não era mais o mesmo. Tinha uma espécie de invólucro que o distanciava de suas origens, de suas metas primeiras, de seus objetivos mais sui generis, de sua proposta alternativa de Poder. Aliás, por se falar em Poder! O PT que conquistou o Palácio do Planalto não é o mesmo que fora fundando em 1980 sob a égide de defesa aos trabalhadores da cidade e do campo e que tentava ser o diferencial no fim lastimável da Ditadura Militar no Brasil. O PT assume o Governo em 2003 com um mandato popular legitimado pelas urnas sentia que, de fato, a Esperança poderia Vencer o Medo. No fim deste terceiro ano de Governo, estamos vivenciando o inverso da história que poderia ser diferente se não fossem as persistências em continuar errando. Sabemos que desde a Campanha o PT começou errando ao apresentar ao país o chamado “Lulinha Paz e Amor”, um jargão utilizado pela Mídia que hoje podemos entender. Mas, como foi a Mídia que o intitulou assim, diria que o Lula apresentado não era o Lula do PT, era o Lula do Campo Majoritário, da chamado Corrente... Que de Corrente somente se percebe a escravidão em suas próprias falhas. O Lula apresentado era o Lula marketeiro, fabricado pelo Duda Mendonça que em tempos passados havia fabricado a síndrome política paulistana denominada Maluf. Era o Lula do Zé Dirceu que mantêm, num estilo pior do que os bolcheviques, o PT ao controle de suas mãos e seus fiéis súditos.

Na verdade, se Bento XVI não se cuidar é capaz do Zé querer tomar seu posto, de tanta ânsia pelo Governo e pelo Poder. Como ficou comprovado em suas falas “meu Presidente, meu Governador, minha Prefeita (Marta), meu Deputado, meu Senador, minha vereadora”, só falta-o dizer agora “Meu Papado”.

Mas, parece-me evidente que o exercício de poder do Zé Dirceu dentro do PT é uma espécie de Papado pré-Concílio Vaticano II onde o Papa era de fato o senhor infalível de todas as coisas, as do céu e as da terra. Toda a crise política ocasionada e testemunhada pelos cidadãos e cidadãs do Brasil tem sua gênese que assim destaco em ordem: mudança no perfil do PT nas eleições (tudo para conquistar o Poder); negação de suas lutas históricas e assumência de uma nova postura, a de ser velho companheiro neoliberal do PSDB (ou seja, assumir as suas causas); a falta de uma política social e uma adesão à política econômica ditada pelo FMI e pelo Banco Mundial; venda de privilégios a correligionários da Corrente do Campo Majoritário; compra de Partidos Políticos para a Base aliada; alianças contraditórias com inimigos históricos (é a mesma coisa de Deus – para os que acreditam – inventar de querer fazer aliança com Satanás – se é que ele exista também); negação de direitos aos trabalhadores como a aprovação da Reforma da Previdência (o que ocasionou na expulsão de pessoas sérias que vieram a fundar – profeticamente – o PSOL, uma nova Páscoa para a política brasileira); entre outros erros e mais erros do PT e do Governo. Parece que o Governo gosta de continuar errando. Errou na eleição para Presidente da Câmara, onde o Brasil todo viu despontar um personagem típico da política oligárquica brasileira, o Severino Cavalcanti, que até coroado com medalha de honra ao mérito foi pelo Palácio. E agora comete os mesmos erros com a eleição de um novo Presidente. São tantos erros e persistências no erro que passaria horas e horas escrevendo que não terminaria jamais.

Mas, dois fatos se sucederam esta semana o que me dá, particularmente, esperança em ver um dia acontecer a tão sonhada conquista popular, a tão sonhada justiça para os pobres. O primeiro fato é tomada de decisão do amigo e irmão de caminhada Plínio de Arruda Sampaio, do deputado Ivan Valente, do amigo cristão Orlando Fantazzini (deputado federal por SP) e do Chico, o nosso Chico Alencar em saírem do PT. Comparo esta saída com a saída do Povo de Israel que se retira do Egito. Era preciso sair do domínio do Faraó, assim como, era preciso sair do domínio dos faraós do Campo Majoritário. E encontram um Partido, pequeno ainda, mas singelo e querido como sua representante oficial que não é nenhuma “faraó” e, muito menos, cacique do Partido, a Senadora Heloísa Helena. O PSOL irá abrigar assim como a Ponte abriga milhões de sem casa por este Brasil, aqueles que deixaram, ou melhor, foram deixados pelo Partido, já que o mesmo tomou rumos contraditórios que não são coerentes com sua história política e popular. Apesar de não ser ainda do PSOL oficialmente, já o sou de coração, e digo Bem-Vindos irmãos e irmãs da caminhada.

Poderia ficar preocupado sem não existisse mais alternativas, mas elas existem, os movimentos sociais e populares não morreram, estão aí, bem vivos, esperando a Páscoa acontecer já que estamos vivendo momentos de Cruz e Trevas. O PSOL só tem a ganhar com estes companheiros e companheiras que deixam o PT. Nunca imaginei estar refletindo acerca disso, pois jamais me imaginei longe do PT que sempre lutei nas bases para se fazer compreendido e hoje, o que vejo é uma profunda tristeza e, ao mesmo tempo, uma alegria por estar vendo despontar no cenário político com o número 50, a sigla PSOL, que será de fato o surgimento de uma nova aurora e um novo raiar.

Ontem, com a saída dos companheiros e de outros tantos, lembrei-me, como cristão, do Profeta Isaías que já dizia: Como o raiar, raiar do dia, a tua luz surgirá... E a luz está surgindo, pois o SOL vencerá as TREVAS do PT e da falsa esquerda. O segundo fato que me deixou numa situação de maiêutica foi a situação limite que chegou o MST. O MST tentou, buscou sentar-se à mesa, buscou entender, mas não deu. O MST talvez tenha sito o movimento social mais próximo de Lula e do PT, mas que ontem disse um Basta! Basta de mentiras, basta de liberar 500 milhões para as emendas dos deputados por causa da Eleição na Câmara e não liberar um centavo para a Reforma Agrária, basta de pagar juros da dívida (o famoso superávit primário que continua pagando bilhões de uma dívida já paga e que parece que somos condenados a paga-la eternamente) a mando do FMI e não assentar uma família sequer no segundo semestre de 2005. Aliás, poderia passar horas para dizer todos os “bastas” do MST.

Confesso que senti uma grande alegria ao ver o MST de novo nas ruas, nas praças e com seu lema tão próprio, tão deles e tão nosso: Ocupar, Resistir e Produzir! Confesso que já estava com saudades desses gritos ecoando dos rostos sofridos daqueles e daquelas que lutam pela Reforma Agrária. O MST é face social dos enganados pelo PT. A Mídia continua afirmando sua velha máxima de que os sem terra invadiram e não sabem diferenciar os conceitos entre invasão e ocupação. Até quando, até quando irão maltratar a semente da esperança social, chamado MST? Até quando as elites continuaram a inculcar na mentalidade do povo brasileiro de que o MST são um bando (até parece voltarmos às mentiras acerca de Lampião e seu bando no início do século XX) de baderneiros, de irresponsáveis, de que invadem terras de pessoas que lutaram e trabalharam tanto para consegui-la? Até quando se verificará a omissão da verdadeira história do Brasil, loteado em seus primeiros anos pela Capitania Hereditária e depois, roubado pelas grilagens de terra que são denunciadas todos os anos pela Comissão Pastoral da Terra? Até quando veremos também as pessoas simples, excluídos da sociedade continuar a reprodução social do conceito de que o MST é um movimento violento, de que pega a terra dos outros que trabalharam (infelizmente, a Mídia não fala de que grilagem de terra não é trabalho) tanto para consegui-la? Até quando veremos irmãos e irmãs tombarem com balas no peito porque defendem a luta dos trabalhadores, como é o caso de Pe. Josimo e Irmã Dorothy (e até quando veremos criminosos condenados pelos crimes contra sem terras serem soltos como é o caso do comandante do Pará a semana passada), entre outros tantos e tantas. É bom lembrar de que havia um receio da elite oligárquica de que Lula faria a Reforma Agrária.

Quantas vezes ouvi pequenos agricultores dizerem enganados por falta de informação: Não voto no Lula por que ele vai fazer a Reforma Agrária, vai tirar os 5 alqueires de terra que tenho. Penso que além da falta de informação desse pequeno agricultor, o pior, é o fato das elites oligárquicas estarem hoje festejando o Governo Lula como o governo das elites que beneficia os banqueiros e os latifundiários. Quem imaginou que as coisas se dariam dessa forma? Ninguém da esquerda socialista, ninguém das CEBs, ninguém dos movimentos sociais e ninguém do MST. Todos acreditaram porque exatamente fundaram aquele PT do passado que existe hoje somente na história brasileira. Assim, diria que o PSOL e o MST são as duas esperanças populares de nossos tempos marcados por incertezas e por trevas. É, por isso, que acredito que no Brasil ainda podemos, ainda se pode. Acredito que é possível um novo Brasil porque existe o MST e o PSOL, sementes lançadas ao chão e que dão frutos aos menos favorecidos, sabem por quê? Por que são os próprios desfavorecidos que comandam o MST e o PSOL. Que o vírus do PT não contamine jamais o PSOL e o MST, e que a doença do Zé Dirceu pelo Poder a qualquer custo não se evidencie em nenhum e nenhuma militante do MST e do PSOL, pois daí poderemos dizer com toda a certeza: Termos um outro Brasil. Por enquanto só podemos afirmar de que ele (o Brasil) ainda é possível.


Claudemiro Godoy do Nascimento

Texto escrito e publicado em 2005.

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